BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Após sucessivos recuos do governo, o
plenário do Senado aprovou nesta quinta-feira (2) a PEC (proposta de emenda à
Constituição) dos Precatórios. A proposta é o mecanismo do governo para
destravar o pagamento do programa social Auxílio Brasil de R$ 400 a partir de
dezembro.
O texto, que dá calote em dívidas judiciais reconhecidas pela
Justiça, foi aprovado no primeiro turno por 64 votos a favor e 13 contrários,
além de duas abstenções.
Os
senadores fizeram um acordo para que a votação em segundo turno se desse na
sequência, sendo a proposta novamente aprovada, por 61 votos a favor e 10
contrários, além de uma abstenção. Era necessário o apoio de pelo menos 49
senadores, do total de 81 parlamentares da Casa.
Como houve alteração no texto, a proposta ainda vai precisar tramitar novamente
na Câmara dos Deputados. Líderes governistas afirmam que há acordo com o
presidente Arthur Lira (PP-AL) para que a votação aconteça com celeridade.
A
parte da PEC que não chegou a ser modificada pelo Senado poderá ser promulgada
antes de a Câmara analisar a nova versão.
Apesar
das concessões feitas pelo governo na negociação com o Senado, os pontos
essenciais da proposta foram mantidos.
A
PEC dos Precatórios é hoje a principal pauta de interesse do presidente Jair
Bolsonaro no Congresso. O objetivo é autorizar o governo a gastar mais e
viabilizar a promessa de elevar o valor do Auxílio Brasil numa tentativa de dar
impulso a Bolsonaro na campanha à reeleição em 2022.
"Eu
tenho que registrar que mais da metade das famílias assistidas pelo Auxílio
Brasil estão no Nordeste, que é a região mais pobre do Brasil", afirmou o
relator da PEC, Fernando Bezerra (MDB-PE), que é líder do governo no Senado.
Para
ampliar em cerca de R$ 106 bilhões as despesas do próximo ano, a PEC tem dois
pilares.
Uma
medida permite um drible no teto de gastos, fazendo um novo cálculo retroativo
desse limite. A outra medida cria um valor máximo para o pagamento dos
precatórios as dívidas que não entrarem nessa lista serão adiadas e quitadas
em anos posteriores.
Nesta
quinta, o governo recuou e atendeu os últimos quatro pontos que foram
demandados. Aceitou que o limite para o pagamento de precatórios tenha validade
até 2026, e não até 2036 como previa a versão anterior.
Ao
reduzir em dez anos o prazo de vigência, a nova versão da PEC não altera os
efeitos da proposta no Orçamento de 2022.
Senadores
temem que a criação de um teto de pagamento de precatórios vire uma "bola
de neve" e a União passe a acumular uma dívida muito grande no futuro. Por
isso, pediram para diminuir o prazo dessa medida.
Para
conseguir apoio à PEC no Senado, o governo apresentou seis versões do texto.
Bezerra afirmou que as alterações na proposta receberam o aval do Executivo.
Em
outra mudança anunciada nesta quinta, o governo também aceitou deixar claro que
o aumento de gastos em 2022, a partir da aprovação da PEC, será vinculado a
despesas obrigatórias, à área social e à prorrogação da desoneração da folha de
pagamentos.
O
texto também prevê um mecanismo de vinculação dos gastos que deixarão de ser
pagos em precatórios para bancar despesas com o programa social e na área de
seguridade social, como aposentadorias, entre 2023 e 2026.
Alguns
senadores reagiram à aprovação da PEC dos Precatórios, apontando que ela não
garante a assistência para todos os brasileiros necessitados. Além disso,
alguns argumentaram que ela representa um duro golpe para a estrutura de
responsabilidade fiscal do país.
"As
estatísticas oficiais informam que mais de 19 milhões de brasileiros passam
fome, então enfatizamos o apoio do Podemos para a medida provisória do Auxílio
Brasil, que deve ser votada ainda hoje. Infelizmente não podemos dizer as
mesmas coisas da PEC dos Precatórios", afirma o líder do Podemos, Álvaro
Dias (Podemos-PR).
O
senador então acrescenta que seria possível "sanar as contas públicas e
permitir o desenvolvimento sem o impacto negativo que teremos com a proposta,
que oferece abalos nos fundamentos do Plano Real, que viola a Lei de
Responsabilidade Fiscal, que altera a política do teto".
A
PEC dos Precatórios foi aprovada na terça-feira (29) na Comissão de
Constituição e Justiça do Senado. No entanto, o texto ainda enfrentava
resistências das principais bancadas. Por isso, o governo teve que ceder ainda
mais antes da votação em plenário.
Nesta
quarta, Bezerra já havia sinalizado com novas versões da proposta para atender
a sugestões de senadores do PSDB, Cidadania e MDB. Pedidos do PSD também já
haviam sido acatados.
Esses
partidos atuam de forma independente ao Palácio do Planalto e podem mudar o
rumo de projetos de interesse do governo em votações apertadas.
O
governo concordou em retirar um trecho da PEC que previa regras para a
securitização da dívida ativa.
Nesta
semana, numa derrota da equipe econômica, o relator aceitou deixar despesas com
dívidas ligadas ao Fundef (fundo da área de educação) fora do teto dos gastos.
O time do ministro Paulo Guedes (Economia) resistia a essa medida.
Para
2022, há mais de R$ 17 bilhões em de dívidas de repasses do Fundef para estados
e municípios. A PEC parcela essa conta em três anos.
Ao
criar um tratamento excepcional para as dívidas do Fundef, o governo então
abriu espaço no limite de pagamento de precatório para atender a um pedido do
PSD e do MDB. Esses partidos defenderam que haja uma prioridade no pagamento
dos precatórios alimentícios (para servidores públicos).
Para
aprovar a PEC, o governo também teve que incluir no texto uma flexibilização
das regras para estados que renegociaram dívidas com a União e acabaram
descumprindo o acordo de não romper o teto de gastos estadual.
A
emenda permite que esses estados possam restituir a União ainda pelo prazo mais
longo (benefício da renegociação da dívida) desde que adotem medidas de
controle de gastos, como impedir aumento salarial a servidores, barrar a
realização de concursos e vedar a criação de novas despesas obrigatórias.
Na
semana passada, o líder do governo incluiu uma brecha para que o Auxílio Brasil
se torne um programa social permanente, como defendem líderes do Senado, e
livra o governo de encontrar uma medida que compense o aumento de gastos nessa
área o que seria por meio de criação de impostos ou corte de despesas.
Na
avaliação de economistas e técnicos do Congresso, isso representa um drible na
LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), que exige a compensação quando o governo
tiver um novo gasto permanente.
Inicialmente,
o governo previa elevar o benefício do Auxílio Brasil dos atuais R$ 224 para R$
400 mensais apenas entre dezembro de 2021 e dezembro de 2022. Como teria
caráter temporário, não seria necessário encontrar uma medida compensatória.
O
Senado, porém, pressionou para que o programa no valor de R$ 400 seja
permanente. Por isso, o governo teve que buscar uma solução para viabilizar a
medida ainda em dezembro e sem precisar aprovar um projeto de aumento de
imposto ou de corte de despesas.
A partir de 2023, novos aumentos a serem concedidos no valor do Auxílio Brasil e no número de famílias atendidas pelo programa só serão liberados após o Executivo apresentar uma medida compensatória.
ENTENDA
OS PRINCIPAIS PONTOS DA PEC DOS PRECATÓRIOS
1)
Mudança no indexador do teto de gastos
-
O que é o teto: Regra constitucional aprovada em 2016 que limita o aumento da
maior parte das despesas federais à inflação do ano anterior
-
Como é hoje: o teto é corrigido pela inflação medida pelo IPCA em 12 meses até
junho do ano anterior
-
Como fica: o valor é recalculado, retroativamente, com base no IPCA de janeiro
a dezembro; na prática, isso amplia o teto
2)
Teto para pagamento de precatórios
-
O que é precatório: dívida da União já reconhecida pela Justiça e sem
possibilidade de recurso
-
Como é hoje: precatórios inscritos no Orçamento são pagos
-
Como fica: é criado um valor máximo a ser quitado no ano (cálculo usa como base
o montante pago em sentenças judiciais em 2016 e corrige esse número pela
inflação); os precatórios que ficarem fora desse limite deverão ser pagos em
outros anos; Senado reduziu o período de vigência desse limite em dez anos
-
Prioridade no pagamento: precatórios de pequenos valores, para idosos e
alimentícios terão preferência para serem quitados no ano em que forem
emitidos; Senado tirou as dívidas do Fundef (fundo de educação) fora do teto de
gastos
3)
Refis a municípios
-
O que diz a PEC: possibilidade de municípios parcelarem dívidas com a União
caso aprovem reformas da Previdência locais
-
Condições: Municípios terão que comprovar mudanças específicas nas regras
previdenciárias. Uma delas é que os servidores municipais não poderão pagar
alíquotas menores que os servidores da União
PRINCIPAIS
MUDANÇAS NO SENADO
-
Limite para pagamento de precatórios vale até 2026, e não até 2036
-
Programa social (Auxílio Brasil) deverá ser permanente, mas não precisa de compensação
pelo aumento de despesas (como corte de outros gastos ou criação de imposto)
-
O aumento nas despesas em 2022, após a promulgação da PEC, será usado para
gastos obrigatórios, para a área social e para a prorrogação da desoneração da
folha de 17 setores
-
Flexibilização para estados que renegociaram dívidas com a União e acabaram
descumprindo acordo de não romper teto de gastos estadual
-
Pagamento de precatório do Fundef fica fora do teto de gastos; professores
receberão recursos como abono salarial, sem que a verba vire aumento de
remuneração permanente
Fonte: MSN
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