Política

Pauta mais conservadora ficará em 2º plano na Câmara, diz novo presidente



Mauro Pimentel/Folhapress
RIO DE JANEIRO, RJ, 15.07.2016: ENTREVISTA RODRIGO MAIA - O presidente da Camara dos Deputados, Rodrigo Maia, Democratas do Rio de Janeiro, concede entrevista exclusiva para Folha de S.Paulo em Sao Conrado, zona sul do Rio de Janeiro. (FSP-FOTO) ***EXCLUSIVO FOLHA***
O novo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ)



O novo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pretende impor um freio à pauta conservadora que marcou a gestão de Eduardo Cunha (PMDB-RJ). 

Eleito com apoio da esquerda, ele diz que evitará a votação de projetos que "radicalizem o ambiente" e gerem confrontos em plenário.
Temas que mobilizam as bancadas evangélica e ruralista, como o Estatuto da Família e a proposta que dificulta a demarcação de terras indígenas, devem sair da lista de prioridades do plenário. 

Maia elogia Cunha, de quem foi aliado até poucas semanas atrás, mas diz que "tende a votar" a favor de sua cassação. Ele acredita que o peemedebista perderá o mandato em agosto. "Acho que não tem muita saída", afirma.
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Folha - A gestão Eduardo Cunha deixou uma pauta conservadora e polêmica na Câmara. Como o sr. lidará com ela?
  Rodrigo Maia - Neste momento de crise, a gente não pode radicalizar mais o ambiente entre governo e oposição, ou entre deputados que pensam de forma conservadora e liberal nos valores.
O Brasil precisa criar um ambiente que seja mais de consenso do que de dissenso. Não quero tensionar as relações na Câmara. Vou deixar os temas que geram mais divisão e mais problemas para um segundo momento.
Muitos projetos que atingem minorias estão avançando, como o que dificulta a demarcação de terras indígenas e o chamado Estatuto da Família. O que pensa sobre eles?

A demarcação é um tema que está distante da minha realidade. Vou tentar equilibrar. Se deixar na mão dos meus amigos [da bancada ruralista], fica difícil... [risos]. 

No caso dos temas de valores da família, eu sempre tendo a votar numa posição mais conservadora. Mas acho que neste momento deve prevalecer o consenso. São poucos meses e teremos uma eleição no meio. Se a gente radicalizar nos temas, não vai avançar para lugar nenhum. 

Parte da bancada evangélica o boicotou porque o sr. apoiou, em 2006, um projeto que criminaliza a homofobia.
Foi o último grande projeto aprovado na Câmara. Isso foi usado de forma sórdida e desleal contra mim.

O projeto precisa ser melhorado no Senado, porque tem alguns excessos. Mas o tema da homofobia preocupa a todos, inclusive os evangélicos. E está na ordem do dia porque ainda estão matando pessoas por causa da orientação sexual delas.
Os evangélicos que não misturam as coisas sabem que meus votos foram majoritariamente conservadores nos últimos anos. Eu caminhei do centro para a direita. 

O Planalto quer liberar os jogos. O que pensa disso?
Sou a favor do projeto que libera resorts com cassinos e prevê investimentos na rede hoteleira. Apenas liberar os bingos não dá, mas precisamos discutir o tema. Hoje temos 8.000 máquinas ilegais. 


A liberação dos cassinos pode ser aprovada neste ano?
Se caminhar na linha de um projeto sério, sim. 


O Ministério Público afirma que a legalização do jogo pode favorecer a lavagem de dinheiro do crime. Como evitar isso?
Criando uma agência com estrutura para fiscalização on-line. Nos EUA, o sistema de controle é muito rígido. No Brasil, há muito dinheiro e nenhuma fiscalização. 


A imagem da Câmara está muito desgastada. O que pretende fazer para melhorá-la?
Estamos vivendo a pior crise desde a redemocratização. O sistema político brasileiro faliu. Nós vamos ter que reconstruí-lo de qualquer jeito.

Todos os partidos terão que ter generosidade para abrir mão de posições. Defendo a redução do número de partidos, com a cláusula de desempenho, e o fim das coligações proporcionais. 

Isso não passou na reforma do ano passado, da qual o sr. foi relator. Pode passar agora?
Não dá para ser daqui a quatro ou cinco eleições. Temos que aprovar algo importante até 2018. Todos precisam entender que não dá para fazer eleição do jeito que a coisa está. E o financiamento empresarial não vai voltar tão cedo.

No campo ético, temos que melhorar os sistemas de controle, que são muito falhos, e encaminhar a comissão especial das dez medidas contra a corrupção, propostas pelo Ministério Público. Precisamos construir um texto que dê uma resposta à sociedade no campo da ética. 

O Planalto acaba de retirar a urgência de um pacote de medidas anticorrupção enviado na gestão de Dilma Rousseff.
A retirada da urgência pode parecer uma vontade de não discutir os temas, mas eu não vejo isso no presidente Temer. Para liberar a pauta legislativa, você precisa usar esses instrumentos. 


Como será a eleição municipal deste ano, após o veto às doações empresariais?
Este ano vai ser o caos. Vai ter muita campanha que não vai fechar. O brasileiro acha que no final as coisas acabam tendo solução. Tem muito candidato achando que no final vai aparecer dinheiro. Não vai aparecer. 


O sr. disse que só votará a cassação de Cunha com quorum alto. Havia articulação para esvaziar o plenário e salvá-lo?
Juro por Deus que nunca ouvi isso, mas posso ter me antecipado. Minha preocupação é dizer à sociedade que este tema será pautado. Se votar com quorum baixo, vão dizer que o Rodrigo Maia mentiu. Prefiro que atrase dez dias a ser cobrado depois. 


O sr. foi aliado de Cunha até pouco tempo atrás. Como pode garantir que não atuará para salvá-lo da cassação?
Ninguém nunca me viu interferindo no Conselho de Ética ou na Comissão de Constituição e Justiça. Não vou ajudar nem atrapalhar. Meu papel é fazer o julgamento com isenção.
Eduardo tem méritos. A Câmara funcionou bem na presidência dele. Reconhecer a virtude no momento em que as pessoas estão por baixo é mais difícil que apontar os erros. Para apontar os erros dele, já tem muita gente. 


Como presidente, o sr. vai votar no processo de cassação?
Não sei.

E se votar?
Minha tendência é acompanhar a cassação. A situação dele é muito difícil. Acho que não tem muita saída. 


Na terça (12), Cunha disse: "Hoje sou eu; amanhã, vocês". O sr. se sentiu ameaçado? Recebeu ajuda financeira dele?
Zero. Nossa relação começou na eleição dele à presidência da Câmara. Ele nunca me deu um real, porque nossa relação no Rio sempre foi de adversários. O Eduardo não me pagou nem almoço. Só na residência oficial, mas aí é a Câmara que paga.

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Na pauta econômica, o que será votado na sua gestão?
A gente tem que votar a PEC [proposta de emenda à Constituição] do teto de gastos e avançar ao máximo na Previdência.

Antes de encaminhar a reforma, o governo precisa de uma estratégia de comunicação. Tem que mostrar como a responsabilidade fiscal impacta a vida das pessoas.
Desde a aprovação da LRF [Lei de Responsabilidade Fiscal], o equilíbrio fiscal deixou de ser questão ideológica para ser questão de Estado. O grande erro da Dilma foi acreditar que podia descumprir a lei. Foi por isso que ela caiu. 

E o projeto que reduz o papel da Petrobras no pré-sal?
Vou pautá-lo. A proposta do ministro José Serra acaba com a obrigatoriedade, mas mantém a preferência da Petrobras [na exploração do pré-sal]. A Petrobras está endividada, e o Brasil precisa atrair capital estrangeiro. 


Dilma Rousseff diz que foi vítima de um golpe para entregar o pré-sal às empresas estrangeiras. O sr. se incomoda ao ser chamado de golpista?
Isso me incomoda zero. Nasci quando meu pai estava no exílio [no Chile, em 1970]. Tenho a convicção de que a Dilma caiu porque houve crime de responsabilidade e porque ela perdeu as condições de governar o país.

Eu ajudei a aprovar o ajuste fiscal do Joaquim Levy [ministro da Fazenda em 2015]. Se minha intenção fosse derrubar o governo, teria ajudado a derrubá-lo antes. 

A CPMF pode voltar durante a sua gestão na Câmara?
O Brasil não tem espaço para aumentar receita. As empresas e as famílias estão endividadas. Ninguém consegue pagar mais imposto.

Sou contra recriar a CPMF. Espero que o governo não faça este pleito, porque eu terei muita dificuldade de encaminhá-lo. A solução para superar a crise não é aumentar a receita. É reestruturar o Estado e reduzir despesas. 

O governo interino também diz isso, mas acaba de dar aumentos a servidores e distribuir 'bondades' aos Estados.
Os Estados estão entrando em colapso. Se não houver um alívio fiscal, muitos vão parar, como o Rio de Janeiro.

Quanto ao funcionalismo, o processo longo de impeachment enfraquece o governo, que ainda é provisório. Há muita pressão inflando servidores contra o Michel [Temer]. Talvez isso tenha gerado muita dificuldade.
Acho que era um erro aprovar aqueles projetos, tanto que saí do plenário para não deixar o meu dedo nas votações. Acho que aquilo não foi bom e espero que não ocorra novamente.
Entendo a angústia dos servidores, mas é melhor receber um salário menor do que ter uma inflação de 40%. Os Estados fizeram muita bondade e agora estão atrasando salários. Se o governo federal fizer muita bondade, vai perder o controle do equilíbrio fiscal e gerar inflação. O que você faz hoje com uma nota de R$ 100 no Brasil?

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