A
palavra de ordem “Não vai ter golpe” ecoa cada vez mais alta dentro do
Palácio do Planalto. Cercada por protestos no entorno da Presidência da
República e prestes a ver o PMDB, o maior partido aliado, desembarcar,
Dilma Rousseff tem feito da sede de seu Governo um bunker de apoio. Nas
últimas semanas qualquer ato público do qual ela participa, a claque de
petistas e de sindicalistas está lá para dar esse suporte, que repercute
na NBR – a TV estatal – nas mídias sociais e serve como pano de fundo
para reportagens de emissoras de televisão. Enquanto, do lado de dentro,
o Planalto tenta reter parte da sua base de apoio e evitar o
impeachment, do lado de fora o PT divulga agenda de atos em
universidades contra o processo de destituição e anuncia para 31 de
março uma nova mobilização nacional com o objetivo de se colar ao
simbolismo da data do golpe de 1964.
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Nas
últimas duas semanas foram ao menos três ocasiões em que centenas de
pessoas ocuparam o Salão Nobre do Planalto para demonstrar apoio à
presidenta. Eram praticamente comícios políticos com direito ao
advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, bradar “Não passarão” e ao deputado federal Olímpio Gomes (SD-SP) ser expulso do local ao tentar se manifestar contra o PT.
O
primeiro evento foi a posse de Luiz Inácio Lula da Silva no ministério
da Casa Civil no dia 16. Os outros foram nos dias 22 e 23, quando
ocorreram um ato de juristas em defesa de legalidade e o lançamento de
edital para pesquisas envolvendo o Aedes aegypti,
respectivamente. Do lado de fora, foram ao menos três protestos pedindo a
queda da presidenta. Neles, o público variou de 1.000 a 8.000
participantes. Na posse de Lula, que foi posteriormente suspensa pela
Justiça, a estrela era o ex-presidente, mas apenas Rousseff discursou e
ouviu jingles de campanhas passadas.
No ato dos juristas,
o Governo ficou no limiar de uma saia justa. Cerca de 70 diplomatas
internacionais participaram do encontro e viram uma militância gritar
por apoio à presidenta. Os que lá estiveram lá não ouviram só argumentos
jurídicos para defender que não há argumentos para um processo de
impeachment, mas se depararam com ataques ao juiz Sérgio Moro,
da Operação Lava Jato, reclamações contra os opositores e aliados
fazendo paralelos entre o momento atual e o golpe em 1964. “Isso é uma
desmoralização total da Presidência da República. Era como um comício de
bairro para desmoralizar um juiz”, reclamou o senador oposicionista
José Medeiros (sem partido – MT).
Em outra frente, Rousseff tem
sido incentivada pelos seus auxiliares a ir mais para a rua. Não para
participar de protestos, como fez Lula na semana passada. Mas para se
reunir com autoridades estaduais e aparecer na mídia local. “Temos que
nos limitar a fazer o que ela sabe fazer, que é discutir propostas com
quem entende do assunto e, claro, aproveitar parte da mídia que não quer
derrubá-la. Pedir para ela ser um Lula e mobilizar a militância não
dá”, diz um dos assessores da presidenta. A avaliação é que, por mais
que corra riscos de se deparar com manifestações, ela precisaria sair do
bunker.
'Solução Temer' e manifestos
O Governo ainda não
desistiu de obter, por votos ou ao menos ausências na Câmara, os números
necessários para barrar o impeachment. Para aprovação no plenário, são
necessários os votos de dois terços dos deputados, ou 342 parlamentares.
Se a soma dos ausentes, dos que se abstiverem e dos que votarem contra
for igual ou superior a 172 votos, o processo será arquivado. Mas, para
consultorias de risco político, como a Eurasia e Arko Advice, salvo
reviravoltas com acusações diretas contra Michel Temer até a votação - ele não aparece, por exemplo, na chamada lista da Odebrecht
-, a saída de Rousseff é uma questão de tempo. Segundo a mais recente
pesquisa Datafolha, 68% aprovam o impeachment, uma maioria que ganha
fôlego como pressão parlamentar em um ano eleitoral.
A "solução
Temer" também é vista com simpatia em setores empresariais dado o
"programa de Governo", documento lançado em outubro chamado Ponte para o
Futuro, de corte liberal e com promessas como mudanças na regras do
ajuste do salário mínimo e flexibilização de leis trabalhistas. A
agenda, no entanto, é vista como mais um fator de aglutinação dos grupos
que a rejeitam em torno de Dilma Rousseff, mesmo que não apoiem o
Planalto.
Neste sábado, o presidente do PT, Rui Falcão, escreveu
em seu Facebook mensagem que embute uma advertência em caso de derrota
da presidenta petista. "As manifestações mostram o seguinte: queremos
paz, mas não tememos a guerra. Se eles acham que haverá estabilidade
derrubando Dilma, estão muito enganados".
Além da ofensiva
internacional oficial do Governo, com entrevistas da mandatária e outros
ministros a veículos estrangeiros, o PT tem divulgado manifestos de
intelectuais em apoio ao Governo, que também incluem acadêmicos
estrangeiros. Um dos mais amplos inclui a assinatura do cantor e
escritor Chico Buarque, do esloveno Slavoj Zizek e do cubano Leonardo
Padura.
Guilherme Boulos, líder do movimento de moradia MTST, é um
dos articuladores do ato contra o impeachment da quinta-feira e diz que
a mobilização visa deter "uma nova direita que agride quem está de
vermelho na rua, que não tolera alguém que pense diferente". "Nós não
temos nenhuma expectativa de que esse Governo vá dar um giro na sua
política [econômica e social]. Esse Governo, sempre que esteve acuado, a
posição que tomou foi girar mais à direita. O que está em jogo é barrar
essa ofensiva antidemocrática que está em curso no país".
Colaborou Marina Rossi.
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