Pedro Franca - 26.fev.2014/Associated Press | ||
O senador Delcídio do Amaral foi acusado de atrapalhar investigações da Lava Jato |
Em delação premiada à força-tarefa da Operação Lava Jato,
o senador Delcídio do Amaral (PT-MS) revelou que o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva mandou comprar o silêncio do ex-diretor da
Petrobras Nestor Cerveró e de outras testemunhas.
Detalhes do acordo foram veiculados pelo site da revista "Istoé", que
publicou reportagem com trechos dos termos de delação. A informação de
que Delcídio fechou acordo de delação premiada foi confirmada à Folha por pessoas próximas às investigações da Lava Jato.
De acordo com os documentos publicados pela revista, o senador também
diz que Dilma Rousseff usou sua influência para evitar a punição de
empreiteiros, ao nomear o ministro Marcelo Navarro para o STJ (Superior
Tribunal de Justiça). O ministro Teori Zavascki, do STF (Supremo
Tribunal Federal), decidirá se homologa ou não a delação.
A principal preocupação do Planalto vai ser explicar as citações a
Dilma, não a Lula. Auxiliares da presidente dizem que é o petista quem
deve cuidar de sua defesa, não o governo.
Em seu relato, Delcídio cita outros senadores e deputados, tanto da base
aliada quando da oposição. Segundo a publicação, o senador petista
revelou que Dilma tentou três vezes interferir na Lava Jato com a ajuda
do ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. "É indiscutível e
inegável a movimentação sistemática do ministro da Justiça, José Eduardo
Cardozo, e da própria presidente Dilma Rousseff no sentido de tentar
promover a soltura de réus presos no curso da referida operação",
afirmou.
O senador diz, segundo a revista, que a terceira investida de Dilma
contra a Lava Jato foi a nomeação de Navarro para o STJ. "Tal nomeação
seria relevante para o governo", pois o nomeado cuidaria dos "habeas
corpus e recursos da Lava Jato no STJ", conta Delcídio.
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De acordo com a revista, Delcídio diz que Lula pediu "expressamente"
para que ele ajudasse o pecuarista José Carlos Bumlai porque o
empresário estaria implicado nas delações de Fernando Baiano e Nestor
Cerveró. Para o senador, Bumlai tinha "total intimidade" e exercia o
papel de "consigliere" da família Lula, expressão em italiano que remete
aos conselheiros dos chefes da máfia italiana. "No caso, Delcídio
intermediaria o pagamento de valores à família de Cerveró", afirma o
acordo de delação.
Na conversa com o ex-presidente, de acordo com outro trecho da delação,
Delcídio diz que "aceitou intermediar a operação", mas lhe explicou que
"com José Carlos Bumlai seria difícil falar, mas que conversaria com o
filho, Maurício Bumlai, com quem mantinha boa relação".
Depois de receber a quantia de Maurício Bumlai, a primeira remessa de R$
50 mil foi entregue em mãos pelo próprio Delcídio ao advogado de
Cerveró, Edson Ribeiro, também preso pela Lava Jato e solto em 24 de fevereiro.
Delcídio passou quase três meses preso por determinação do STF após ser
gravado por um filho de Cerveró tramando a fuga do ex-diretor da
Petrobras. Ele foi solto em 19 de fevereiro e a seguir pediu licença
médica do Senado. Na negociação do acordo, conforme informou a Folha
em fevereiro, Delcídio se mostrou disposto a implicar senadores do
PSDB. O senador presidiu em 2005 a CPI dos Correios, que investigou o
escândalo do mensalão.
CARF
Em seu relato no acordo, Delcídio afirma, ainda segundo a revista, que
uma das maiores preocupações de Lula é a CPI do Carf (Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais), já que as investigações podem
atingir os filhos do ex-presidente, Fábio Luiz Lula da Silva e Luiz
Claudio Lula da Silva.
O senador conta que várias vezes foi convocado por Lula para evitar a
convocação de Mauro Marcondes e Cristina Mautoni para depor. De acordo
com o relatório da Lava Jato, como líder do Senado, Delcídio "mobilizou a
base do governo para derrubar os requerimentos de convocação do casal".
Em outro trecho sobre o ex-presidente, o senador afirma que o silêncio
do publicitário Marcos Valério, pivô do escândalo do mensalão, foi
comprado e diz que o assunto foi discutido com Paulo Okamotto, atual
presidente do Instituto Lula. O pagamento, inicialmente estimado em R$
220 milhões, mais adiante ficou sob "a responsabilidade" do ex-ministro
Antônio Palocci.
PASADENA
Uma das partes mais contundentes do acordo aborda a compra da refinaria
de Pasadena, no Texas, pela Petrobras. O depoimento, diz a "Istoé",
afirma que Dilma, como presidente do Conselho de Administração da
Petrobras, tinha "pleno conhecimento" do processo de aquisição da
unidade e "de tudo que esse encerrava".
A compra da refinaria gerou prejuízo milionário à Petrobras e foi alvo da 20ª fase da Lava Jato, chamada de "Corrosão".
A revista afirma que Dilma atuou de maneira decisiva para que Cerveró
fosse mantido no cargo de diretor da área Internacional da Petrobras, em
2008. Ele acabou sendo realocado em uma diretoria da estatal BR
Distribuidora.
REPERCUSSÃO
O presidente do PT, Rui Falcão, disse a interlocutores que não pretende
se manifestar e recomendou que os integrantes da cúpula do partido não
se manifestem sobre o teor da proposta de delação premiada do senador
Delcídio do Amaral.
Reunida em São Paulo, a cúpula do PT definiu como estratégia, porém,
desqualificar o teor das acusações, alegando que o senador está magoado
com o partido. A decisão, até agora, é de não se manifestar formalmente e
de responder apenas se for oficialmente questionado.
A informação sobre a delação caiu como uma bomba na reunião da executiva
nacional do PT. O encontro foi convocado para debater estratégia para
as eleições municipais. Mas a notícia mudou a pauta da reunião.
O Instituto Lula estuda divulgar nota no início da tarde desta quinta.
Durante a cerimônia de posse de novos ministros, nesta quinta, Dilma criticou
a delação de Delcídio. "Continuaremos defendendo que a presunção de
inocência não pode ser substituída pelo pressuposto da culpa e nem dar
lugar à execração pública sem acusação formal. E também à condenação sem
processo por meio de vazamentos ilegais e e seletivos."
"O combate à corrupção continua sendo uma prioridade em meu governo e
nenhum governo realizou um enfrentamento tão duro e eficiente como o
meu. E continuará sendo assim", disse Dilma.
A presidente ainda convocou uma reunião de emergência
com seus assessores mais próximos no Palácio do Planalto para discutir
os efeitos no governo das declarações do senador e a estratégia da
presidente diante do assunto.
A ordem inicial no Palácio do Planalto é descredenciar Delcídio, repetir
que ele falou mentiras "em outras ocasiões", e que, portanto, "não tem
credibilidade" para dar informações.
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