O procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, acusa o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ), de ter negociado a inclusão de projetos de interesse de
empreiteiras que fazem obras para os Jogos Olímpicos do Rio, durante a
apreciação no Congresso de medida provisória (MP) enviada pelo governo. A
MP 584, de 2012, concede incentivos tributários para a Olimpíada de
2016. Segundo Janot, Cunha acertou com José Aldemário Pinheiro,
conhecido como Léo Pinheiro, executivo da empresa OAS, que faz obras
para os Jogos, o pagamento de R$ 1,9 milhão para beneficiar
empreiteiras.
Na medida cautelar em que pede ao ministro do
Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki o afastamento de Cunha do
cargo de deputado federal, Janot informa que, poucos dias depois de
trocar mensagens sobre a MP 584 com Léo Pinheiro, "Cunha cobrou o
pagamento de valores, que, pelo teor das conversas anteriores, era em
duas partes: R$ 1,5 milhão e R$ 400 mil".
No documento enviado
ao Supremo, Janot sustenta que Eduardo Cunha tratou da apresentação de
emendas à MP 584 com o então senador Francisco Dornelles (PP-RJ), hoje
vice-governador do Estado do Rio de Janeiro.
"Francisco
Dornelles apresentou nada menos que 15 emendas à referida MP", diz o
procurador na medida cautelar. Janot destaca a emenda 52, em que
Dornelles propõe medidas de incentivo fiscal para investimentos em
infraestrutura de transporte que facilitassem a mobilidade urbana no
Rio, sede dos Jogos.
A emenda foi inclusa no texto final da MP. Na
medida cautelar, o procurador identifica incorretamente Dornelles como
deputado, e não senador.
O procurador informa que, em troca de
mensagens por celular com Léo Pinheiro, Cunha perguntou ao executivo da
OAS se havia "emenda de vocês" à MP 584. Em seguida, disse que falaria
com Dornelles. Janot destaca que Dornelles é "conhecido de longa data de
Eduardo Cunha". O procurador disse ainda que, um mês depois das
primeiras mensagens sobre a MP 584, Cunha disse a Léo Pinheiro que o
texto da MP "ficou muito bom" e "alcança todas as obras no Rio".
Investigado
pela Operação Lava Jato, que apura esquema de pagamento de propinas na
Petrobras e em outras estatais, Léo Pinheiro foi condenado em agosto
deste ano pelo juiz federal Sergio Moro a 16 anos e 4 meses de reclusão
por corrupção, lavagem de dinheiro e atividade em organização criminosa.
O executivo, que sempre negou qualquer envolvimento no esquema de
corrupção e recorreu da condenação, aguarda em liberdade a manifestação
da segunda instância do Judiciário.
No documento encaminhado a
Teori Zavascki, o procurador cita outras medidas provisórias discutidas
em mensagens por Cunha e Pinheiro. Janot diz que a "relação espúria se
verifica, ainda, nas centenas de mensagens trocadas entre Léo Pinheiro e
Eduardo Cunha" por celular.
"A partir de tais mensagens, é
possível verificar nitidamente o modus operandi do grupo criminoso.
Projetos de lei de interesse das empreiteiras eram redigidos pelas
próprias empreiteiras, que os elabora, por óbvio, em atenção aos seus
interesses espúrios, muitas vezes após a `consultoria'' de Eduardo
Cunha", afirma Janot.
De acordo com o procurador, projetos e
emendas de interesse das empreiteiras eram apresentados, muitas vezes,
"por meio de algum deputado ligado a Eduardo Cunha, para não vinculá-lo
diretamente".
A obra mais importante da OAS para a Olimpíada é a
revitalização da zona portuária carioca, um investimento de R$ 8 bilhões
em Parceria Público-Privada (PPP) com a Prefeitura do Rio. A
empreiteira faz parte da Concessionária Porto Novo, com 37,5% das ações,
em sociedade com as empreiteiras Odebrecht (37,5%) e a Carioca
Engenharia (25%).
As obras incluem um novo sistema viário na
região, com construção de avenidas e vias expressas. Para os Jogos
Olímpicos, a OAS também participa da construção do Parque de Deodoro -
sede de esportes olímpicos na zona oeste -, de reservatórios contra
enchentes e da limpeza das lagoas da Barra da Tijuca (zona oeste), que
são muito poluídas.
A OAS foi procurada por e-mail ontem, mas não
respondeu. O vice-governador Francisco Dornelles não retornou as
ligações. Cunha não respondeu mensagem enviada ao seu telefone celular.
Em
reportagem publicada ontem pelo 'Estado', o presidente da Câmara disse
que a medida cautelar de Rodrigo Janot "beira o teatro acusatório e
chega quase ao ridículo" e afirmou que não comentaria trechos
específicos do documento.
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