Embalados pelo pedido de prisão preventiva do ex-presidente Lula e pela definição do rito de impeachment
pelo Supremo Tribunal Federal na última semana, centenas de milhares de
manifestantes tomaram ruas de diversas cidades do país neste domingo
pela quinta vez para reivindicar a saída da presidenta Dilma Rousseff.
De acordo com o site G1, ao todo três milhões foram às ruas em 229
cidades, levando em conta dados fornecidos pela Polícia Militar. Em São
Paulo, que costuma ser o termômetro político e social do país, o ato
reuniu 500.000 pessoas na avenida Paulista, segundo o Datafolha, mais
que o dobro do número alcançado em março do ano passado, de acordo com o
mesmo instituto. Após cambalear “ – o último ato pelo afastamento da petista,
em dezembro do ano passado, teve público menor que o esperado –, agora
os grupos que querem a saída do PT do Governo colocaram de vez a
presidenta nas cordas.
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Esta é a maior manifestação
de rua da história da democracia do país depois do fim da ditadura, e
mostra o fôlego que os movimentos pró-impeachment, que nasceram em 2014,
atingiram. A marcha pelas eleições diretas (Diretas Já), uma referência
de multidões, levou às ruas 400.000 pessoas em 1984. Se na primeira grande manifestação pró-impeachment
em março do ano passado os grupos que pediam a saída de Dilma dividiram
espaço na avenida Paulista com reivindicações difusas, como os pedidos
da intervenção militar, desta vez o discurso foi mais afinado. O
sentimento que se sobressaiu, de maneira geral, é de total rejeição ao
PT e ao Governo e que “qualquer coisa” será melhor que Dilma Rousseff na
presidência. "Qualquer um é menos pior que Dilma", disse a dentista
Fátima Gerbasi. "Não tem importância se é o Temer que assume [o Governo,
em um eventual impeachment]. Vão fazer um Governo de coalizão e isso
vai ser bom".
Os protestos multitudinários são uma má notícia para
a presidenta que vai encarar um processo de impeachment na Câmara e
está sob a ameaça de perder o apoio do PMDB, seu principal aliado nos
últimos 13 anos. O grito nas ruas deve empurrar parlamentares indecisos a
votar favoráveis a sua destituição via impeachment, e pode acelerar até
a análise de suas contas de campanha no Tribunal Superior Eleitoral. A
mandatária ainda tem o mercado financeiro jogando contra a sua
permanência para que a crise política ganhe um rumo e desate o nó da
economia. Definitivamente, não foi um dia feliz para a presidenta.
Mas, políticos da oposição também não foram poupados e receberam vaias no meio da massa. Em São Paulo, o governador Geraldo Alckmin e o senador Aécio Neves,
ambos do PSDB, foram chamados de “oportunistas” nas ruas, o que os
obrigou a abreviar sua passagem pela Paulista para não mais que 30
minutos. Em alguns momentos, o protesto parecia um grito contra todos os
políticos. Marta Suplicy
(PMDB), caloura na oposição, também foi vaiada e chamada de “vira
casaca”. Pré-candidata do PMDB à prefeitura de São Paulo, a senadora
deixou o PT em abril de 2015.
Em Brasília, onde a manifestação
ocorreu na parte da manhã e reuniu 100.000 pessoas, segundo a Polícia
Militar, o início da passeata foi confuso, com locutores de cinco carros
de som falando ao mesmo tempo. No percurso, os manifestantes pararam em
frente à Catedral da cidade e rezaram um Pai Nosso. O deputado federal de extrema direita Jair Bolsonaro
(PSC-RJ) fez um discurso tumultuado. Enquanto falava, do alto de um
carro de som, alguns de seus apoiadores seguravam cartazes com os
dizeres #Bolsonaro2018, uma alusão a sua eventual candidatura à
presidência daqui a dois anos, e ocupantes de outros trios elétricos,
contrários à presença de políticos no evento, gritavam palavras de ordem
contra o PT, contra o ex-presidente Lula e contra Dilma, abafando a
fala de Bolsonaro.
Entre os que demonstravam sua indignação, havia
uma aposentada que se considera profissional em protestos pelas ruas da
capital federal. Rosa Maria de Paula, 57, afirma que participou dos
atos das Diretas Já, do pedido de impeachment de Fernando Collor de Mello
e que agora, mesmo tendo votado em Lula até 2002, não vê outra saída
para o país, que não a destituição da presidenta Rousseff e dos
presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), e do Senado, Renan
Calheiros (PMDB). “O PT só trouxe corrupção e roubalheira. Por isso sou a
favor do impeachment da Dilma e da cassação do Renan e do Cunha”.
De
modo geral, não houve os confrontos que se esperavam e o perfil do
público continuou repetindo o mesmo padrão: a classe média alta, branca,
muitos que nunca votaram no PT e outra parcela que já votou mas agora
rejeita a condução do partido. Neste domingo, a exaltação ao juiz Sérgio
Moro se repetiu, assim como à Polícia Federal. Em São Paulo, eles
ganharam cartazes, bonecos, camisetas e faixas em homenagem ao trabalho
realizado na Operação Lava Jato. Além dessas figuras já costumeiras nas
ruas, o promotor do Ministério Público de São Paulo Cássio Conserino
estreou entre os heróis. Conserino foi um dos autores do pedido de prisão preventiva de Lula enviado à Justiça na última quinta-feira. "Lula molusco, pode esperar, o Conserino vai te pegar", cantaram na avenida Paulista.
Enquanto as ruas fervilhavam, Moro
soltou uma nota. "Neste dia 13, o povo brasileiro foi às ruas. Entre os
diversos motivos, para protestar contra a corrupção que se entranhou em
parte de nossas instituições e do mercado. Fiquei tocado pelo apoio às
investigações da assim denominada Operação Lava Jato", disse o juiz. Na
carta, em que ele diz também que é “importante que as autoridades
eleitas e os partidos ouçam a voz das ruas”, Moro surfa em uma onda
iniciada no ano passado, quando passou a ser chamado de herói nas ruas.
As
notícias que embalam a marcha tornam o momento político favorável para a
pressão nas ruas e no Congresso, onde a presidenta sofre desde o início
do mandato nas mãos de uma bancada oposicionista. Com a mobilização, os
líderes dos movimentos se sentem seguros para cravar, inclusive, uma
data para o nocaute final de Dilma Rousseff. "Até maio ela cai",
afirmava Renan Santos, do Movimento Brasil Livre
(MBL), em um discurso inflamado para uma multidão que o aplaudia na
avenida Paulista. O senador Ronaldo Caiado (DEM) também mostrou
segurança ao falar da derrubada do Governo, estimando um tempo – um
pouco mais generoso que o MBL – "Se Deus quiser, até junho já
teremos encerrado este momento da história brasileira e caçado a
presidente", disse no carro de som do Movimento Endireita Brasil.
Já
no carro de som do Vem pra Rua, o maior movimento pró-impeachment,
predominava um clima ufanista. O hino nacional foi executado duas
vezes, e os manifestantes exortados a cantar com o braço direito em
riste. “Parabéns a todos aqueles que ainda se emocionam com o hino!”,
gritou Rogério Chequer,
um dos coordenadores do grupo. Na sequência, os alto falantes tocaram o
tema da vitória do piloto Ayrton Senna da Silva, morto em 1994.
Provocações contra militantes do PT – que supostamente seriam pagos para
comparecer a atos pró-Governo – também deram o tom. “Quem recebeu um
real para estar aqui? Eu vim de graça!”, gritava um dos porta-vozes do
Vem pra Rua.
No Rio o ato também foi o maior dos últimos anos e
também teve o início marcado pela oração de um Pai Nosso, seguido pelo
hino do Brasil. De um trio elétrico, um locutor acusou Dilma pelo
"assassinato do povo brasileiro". “Chegamos ao limite. É a primeira vez
que venho a uma manifestação, deixei meus netos em casa e vim para
demonstrar meu apoio ao Ministério Público”, afirmou o empresário
aposentado Ricardo Castro, 71, que participava do ato na orla de
Copacabana, zona sul da cidade. O grito mais ouvido na manifestação era
“eu não quero viver em outro país, quero viver em outro Brasil!”
Enquanto
os protestos ocorriam, os ministros de Dilma acompanharam com atenção
todos os passos. Ao fim do dia, a presidenta se reuniu com seu núcleo
duro, formado pelos ministros Ricardo Berzoini (Secretaria do Governo),
Jaques Wagner (Casa Civil), José Eduardo Cardozo (Advocacia Geral da
União) e Edinho Silva (Secretaria de Comunicação) para discutir como
iria se pronunciar diante de tanta mobilização. Ao fim, decidiram apenas
emitir uma nota de cinco linhas destacando respeito pelos protestos. “A
liberdade de manifestação é própria das democracias e por todos deve
ser respeitada. O caráter pacífico das manifestações ocorridas neste
domingo demonstra a maturidade de um país que sabe conviver com opiniões
divergentes e sabe garantir o respeito às suas leis e às instituições”,
diz a íntegra do documento.
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